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Sobre o Relatório de Gestão e prestação de Contas 2012

A apreciação do Relatório de Gestão e prestação de contas do Município não é um mero exercício técnico-contabilístico para aferir do rigor, da conformidade das contas prestadas e da sua transparência. Muito para além dos aspetos técnicos, o que nos compete fazer é uma apreciação dos critérios políticos que presidiram à sua execução em íntima e indissociável ligação ao Orçamento aprovado e às GOP.

Em primeiro lugar quero começar por registar uma observação crítica sobre a disponibilização dos documentos para análise, nomeadamente os relatórios de gestão da Câmara e dos SMTUC. Apenas me foram entregues no dia 25 de Abril o que, convenhamos, dada a natureza e densidade da informação em causa, é manifestamente desadequado para uma análise em tempo útil e com maior profundidade.

Mas passemos à análise crítica dos documentos fornecidos da gestão orçamental de 2012. Desde logo, como nota negativa assinalamos um acentuado desfasamento entre as receitas previstas e orçamentadas, quer correntes quer de capital e as correspondentes taxas de execução das mesmas. Desfasamento que se traduz numa diferença negativa de 52,4 M€. Isto porque a taxa de execução total se ficou apenas pelos 65,2%, uma das mais baixas taxas de execução dos últimos cinco anos. Falha clamorosamente a taxa de execução da rubrica “Venda de bens de investimento” que se ficou pelos escassos 0,27% apenas arrecadando 61.703€ dos 22,5 M€ previstos em dotação. Assinale-se a baixa taxa de execução das receitas de capital que apenas alcançou os 38% arrecadando apenas 24,4 M€ dos 64,2 M€ previstos em sede de orçamento. Esta é uma situação que vem sendo sistematicamente observada ano após ano e, quanto a nós, reflete uma reiterada má prática de gestão por parte deste executivo municipal que sempre inflaciona as receitas comprometendo, desta forma, a concretização as dotações orçamentais previstas e aprovadas por esta Assembleia. Não valerá a pena vir argumentar com a crise recessiva e as condições pouco favoráveis do mercado para a alienação de bens de investimento. Estas eram sobejamente conhecidas e por isso mesmo deveriam merecer avisadas cautelas. Um desfasamento tão grande, entre as receitas previstas e as cobradas, repetido ano após ano, como já noutras alturas afirmámos, não só não traz verdade ao orçamento e às suas propostas de execução, como gera alguns efeitos negativos, um dos quais poderá ser, a falta de liquidez financeira que além de comprometer o desenvolvimento de vários projetos e ações inscritas em sede de orçamento e das GOP, pode ainda induzir à realização dedespesas sem a necessária cobertura financeira. Consequência natural de tal situação é a dilatação dos prazos médios de pagamento de dívidas a terceiros, que em 2012 se situou nos 112 dias refletindo a as dificuldades de fazer face aos compromissos de curto prazo. Situação que não deixa de ter efeitos bastante negativos quer na falta de liquidez das empresas fornecedoras de bens e serviços, como nos encargos com juros de mora que tais atrasos acarretam, agravando a despesa em termos que não são de forma alguma negligenciáveis.

Ainda a propósito das receitas cobradas não podemos deixar de ressaltar o significativo peso dos impostos diretos sobre os cidadãos que atinge os 39,5% das receitas no valor de 38,8 M€, sendo que só o IMI fornece 25,7 M€, constituindo mais de um quarto do total da receita (26,1%). O IMI e a derrama cobrem 67% do total da despesa paga.

Numa situação de profunda crise económica e social, como a que vivemos, em que o desemprego galopante já ultrapassa os 9 mil desempregados no concelho de Coimbra e tendo em linha de conta a evolução francamente positiva que a receita do IMI tem vindo a registar de ano para ano, coloca-se na ordem do dia a necessidade de proceder a uma ligeira redução das taxas de IMI, como propusemos em momento oportuno, de modo a aliviar a carga de impostos sobre os munícipes. Com sabemos são cada vez em maior número os casais e pessoas singulares que se veem obrigados a entregar as suas casas ao fisco. Uma eventual quebra de receitas poderia ser compensada com a aplicação de taxas de agravamento do IMI a aplicar aos proprietários dos prédios devolutos e degradados, o que, articulando com outras medidas, por nós já propostas, de incentivos à reabilitação urbana, poderia constituir uma estratégia de incentivo aos proprietários para procederem à reabilitação dos seus prédios, sobretudo nos centros históricos da cidade, que estão em situação de progressivo abandono e decadência acelerada. Não esquecemos a promessa do senhor presidente, feita aqui, aquando da última discussão sobre o IMI no sentido de proceder a um abaixamento mais significativo da respetiva taxa.

Também nos preocupa o aumento do passivo da Câmara que se tem vindo a agravar significativamente atingindo um montante total relevante na ordem dos 196 M€. Enquanto o passivo de médio e longo prazo e da dívida à banca atinge os 72,6 M€, mantendo-se a um nível relativamente elevado.

Analisemos as taxas de execução orçamental das GOP na sua totalidade. Em todos os parâmetros, exceto nas receitas de fundos comunitários, os indicadores de eficácia são dos mais baixos que se registam nos últimos cinco anos, quer seja pela ótica da despesa cabimentada (70,4%); pela despesa por compromissos 60,7%); pela despesa faturada (55,4%) ou pela despesa paga (49,9%).

Mas analisemos com mais pormenor as taxas de execução orçamental por objetivos e programas:

- “Promoção da habitação e renovação urbana” financiamento definido: 4,8 M€., realizado apenas 1,6 M€. (33,3%).

- “Reabilitação Urbana dos Centros Históricos” financiamento definido: 4,4 M€., realizado apenas uns insignificantes 509 mil euros (11,3%) Numa cidade que tanta falta tem de habitação social, com um edificado tão degradado e centros históricos em estado calamitoso compreende-se mal um tão escasso investimento.

- “Valorização do património histórico e cultural” financiamento definido: 445 mil euros, realizado 21 mil euros (4,8%).

- “Ambiente, espaços verdes e jardins” financiamento definido: 1,15 M€, realizado 314 mil euros (27,2%). Numa já escassa dotação para as necessidades da cidade, uma miserável execução que se reflete no aspeto desmazelado e mal tratado dos espaços verdes e jardins da nossa cidade.

- “Desenvolvimento económico e apoio à atividade empresarial” financiamento definido: 710 mil euros, realizado 90 mil euros (12,8%). Num concelho a definhar do ponto de vista da iniciativa empresarial e de fraco dinamismo económico, uma magra dotação e uma insignificante concretização.

- “Ação social e família” financiamento definido:1 M€, realizado 411 mil euros (40,3%). Em período de profunda crise económica e social, com mais de 9 mil desempregados, com a pobreza e a exclusão social a aumentar a olhos vistos, custa a crer que uma dotação financeira já por si bastante insuficiente se fique por uma tão baixa taxa de execução.

- “Igualdade de oportunidades na educação” financiamento definido: 4,1 M€, realizado 2,44 M€ (58,5%). Compreende-se mal uma tão fraca execução orçamental num período em que as sociais e económicas das famílias são cada vez maiores e nas escolas se fazem sentir de forma dramática as carências acrescidas das crianças exigindo um significativo reforço da ação social escolar, nomeadamente nas refeições escolares, lanches e reforços alimentares.

Sr. Presidente a isto não se pode chamar outra coisa se nãomá gestão fruto de opções erradas e de corte de investimentos em áreas absolutamente essenciais.

Neste contexto vir apregoar como sinal de uma boa gestão e de racionalidade dos investimentos, a existência de um resultado líquido positivo de 5,5 M€. pode ser um exercício contabilístico interessante em termos propagandísticos nos media, mas em termos reais é uma falácia, puro exercício de demagogia que não resiste a uma análise mais detalhada pondo a nu o absurdo de tal situação.

Já para não falarmos na enorme diferença de 25,5 M€ entre o financiamento definido e o cabimentado, repare-se que entre o financiamento cabimentado e os compromissos assumidos há uma diferença de 8,3 M€.

Não nos parece que o caminho para uma boa gestão possa passar por não executar os projetos definidos e aprovados; por diminuir o investimento em áreas tão importantes e prioritárias como aquelas que atrás mencionámos; por não transferir para as freguesias as dotações que estavam definidas em orçamento (6 M€) ficando-se pelos 5,1 M€.

Creio que resulta evidente que o resultado líquido apresentado resulta de uma diminuição do investimento e, sobretudo de um conjunto de opções no mínimo incompreensíveis à luz dos tempos de crise por que passamos.

Estas são razões mais do que suficientes para não votar favoravelmente o relatório de prestação de contas.

Quanto ao relatório de gestão dos SMTUC

Mais uma vez reafirmamos o nosso apoio solidário e ativo, quer nesta Assembleia, quer no Parlamento nacional, contra a discriminação negativa de que são vítimas os cidadãos de Coimbra e seu concelho ao terem de suportar os custos sociais do transporte público, que no orçamento de 2012, atingiu os 2,4 M€ num total de transferências da Câmara de 5 M€., ao invés do que acontece com os cidadãos de Lisboa e do Porto que usufruem de subsídios compensatórios concedidos aos transportes públicos da Carris e dos SMTP. Registamos igualmente que a chama da verve contestatária da coligação da maioria murchou inexoravelmente, perante a continuidade das mesmas políticas discriminadoras praticadas pelo governo PSD/CDS que continua a tratar cidadãos de Coimbra e de outras cidades que suportam redes de transportes públicos, como cidadãos de segunda categoria.

Quanto aos indicadores de gestão dos SMTUC preocupa-nos bastante o que diz respeito ao número de passageiros transportados, pois que ao invés de aumentar a procura, regista-se nos últimos anos uma tendência contínua e acentuada para a sua diminuição. Em 2012 registou-se uma quebra de 9,5%, perdendo mais de 1500 utentes. Urge inverter esta situação tanto mais que ameaça tornar-se uma tendência irreversível.

Tornar os transportes públicos mais cómodos e atrativos e simultaneamente mais eficientes quer na circulação quer no que toca aos gastos energéticos. Por isso reiteramos que a se deveria apostar mais nos carros elétricos e nos autocarros a gás natural, mais ecológicos e mais baratos em teros de consumos energéticos.

Registamos como positivo os resultados obtidos no Projeto CIVITAS Modern, no sentido de promover melhorias sustentáveis na mobilidade urbana e intermodal. Aguardamos com expetativa que a promessa de produção de energia hidroelétrica na Ponte Açude passe rapidamente a ser concretizada.

Tendo em conta as condicionantes que presidem à gestão/exploração dos serviços de transportes públicos dos SMTUC, e reconhecendo a sua importância estratégica para a cidade, defendemos de forma clara e inequívoca a sua manutenção enquanto serviço municipalizado, recusando liminarmente uma eventual passagem a empresa municipalizada. E não votaremos contra o relatório de gestão apresentado.

 

O deputado municipal do Bloco de Esquerda

Serafim Duarte