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O balanço que é devido

Provavelmente, será esta a última sessão da Assembleia Municipal neste mandato de 2009 a 2013. Por isso, ocorre-me, em jeito de balanço, destacar aqui quatro pontos:

Em primeiro lugar, saúdo a aprovação pelo Comité da Unesco, reunido em Pnom Penh, no passado dia 22, da candidatura de Coimbra (Universidade, Alta e Sofia) a Património da Humanidade. O Bloco de Esquerda congratula-se com este reconhecimento e junta-se a todas as entidades e a todos os cidadãos que entendem celebrá-lo e que, por isso, se devem sentir mais responsabilizados na sua valorização. Sobre este assunto, contudo, dado que acaba de ser decidido convocar uma Assembleia Municipal extraordinária, para, em conjunto com personalidades responsáveis da cidade a convidar, se projetarem as tarefas que a todos se impõem, guardarei para essa ocasião algumas reflexões sobre o assunto.

Um segundo ponto: apesar desta recente boa notícia, tivemos, enquanto autarquia, sobretudo neste último biénio, uma vida altamente conturbada. Saliento, a tristemente célebre Lei n.º 11-A/2013, de 28 de janeiro, que, após um processo conduzido de forma autoritária e antidemocrática, amputou o mapa das freguesias e restringiu, designadamente nas zonas mais desfavorecidas e desertificadas do país, o acesso dos cidadãos a serviços de proximidade a que constitucionalmente têm direito. Este diploma, aprovado, sob a batuta do emblemático ministro Relvas, exclusivamente pelos deputados da maioria governamental e com a reprovação expressa das restantes bancadas parlamentares e de muitos autarcas daquela área política, constituiu um rombo forte no edifício do poder local, sem ter resolvido de forma adequada algumas das distorções que há muito são reconhecidas, quer em termos de território, quer em termos de competências e meios orçamentais das freguesias.  

Se a isto acrescentarmos as várias subtrações nos orçamentos municipais, designadamente através da retenção pelo poder central de parte significativa das receitas do IMI, bem como os constrangimentos impostos à sua elaboração, designadamente àquelas Câmaras que têm sido extremamente rigorosas no enquadramento financeiro da sua atividade, temos um quadro altamente deprimente, completado com um discurso governamental que dá prioridade absoluta e cega à austeridade para dentro, ao mesmo tempo que se revela impotente, submisso e perdulário perante a especulação financeira internacional e as orientações irresponsáveis, já mais que manifestas, das entidades integrantes da troika. Não nos esqueçamos que as denúncias que os vários partidos da oposição bem como diversos coletivos de cidadãos têm feito desta desastrosa linha política – uns mais cedo que outros, é certo – são agora, felizmente, partilhadas por personalidades que há dois anos aplaudiam, sem reservas, estas medidas governamentais e que finalmente reconheceram os efeitos nefastos que elas produziram no tecido económico, designadamente no que é constituído pelas pequenas e médias empresas cuja produção se destina predominantemente ao mercado interno. Lamentamos que as críticas cruzadas entre o FMI, a Comissão Europeia e o BCE nos revelem um cenário lamentável e revoltante de incompetência e de irresponsabilidade.

Em terceiro lugar, refiro a decisão do Tribunal Constitucional que considerou inconstitucionais normas do diploma que estabelecia um novo regime jurídico para as autarquias locais e um novo estatuto das entidades intermunicipais. Tal projeto de diploma foi aqui por nós denunciado em devido tempo, nomeadamente porque impunha um quadro novo e mais restritivo da participação dos cidadãos e dos seus órgãos eleitos na vida autárquica. Ainda bem que esta tendência autocrática foi, para já, estancada, o que constituiu, sem dúvida, um motivo de satisfação para aqueles e aquelas que entendem a Constituição da República como um paradigma seguro e atualizado da vida democrática e que o sentido das reformas do Estado deve ser o do alargamento e do reforço da participação dos cidadãos na vida política e da afirmação dos poderes dos órgãos autárquicos, devidamente decorrentes da vontade dos eleitores. Contudo, não devemos distrair-nos, uma vez que o governo ameaçou retomar o assunto e apresentar outro texto legal, para contornar o chumbo do Tribunal Constitucional.

Finalmente, em nome do Bloco de Esquerda, quero aqui, mais uma vez, saudar todos os cidadãos e cidadãs, trabalhadores no ativo e reformados, desempregados e jovens à espera do primeiro emprego, que se solidarizaram e convergiram na importante greve geral do passado dia 27, e que se têm manifestado, corajosamente, nos órgãos de comunicação social e na rua, nos seus locais de trabalho e de residência, contra este governo e estas políticas que nos submetem, sem aparente remissão, aos ditames de forças sem rosto e sem moral, que desprezam os direitos humanos e que, quais máquinas de guerra, tudo arrasam e, no fim, partem para outra, sem qualquer pudor e sem que os povos tenham a possibilidade de os identificar e punir. A cumplicidade dos governos que resultam de eleições com outros diretórios internacionais que não se sujeitam a tal escrutínio é a marca antidemocrática da coligação transnacional que nos governa e que comanda os nossos destinos, contra os quais é urgente unir forças.

Resistir e lutar, sempre, é, pois, a nossa agenda.

 

Coimbra, 29 de junho de 2013 

O deputado municipal do Bloco de Esquerda

José João Lucas